”Trazer
o invisível
à tona é
da natureza
da fotografia”

Carla Romero

Quintal, uma realidade invisível a olho nu

“Ver é, por princípio, ver mais do que se vê, é aceder a um ser latente. O invisível é o relevo e a profundidade do visível.”

Merleau-Ponty

Thomas, o celebre fotógrafo do filme “Blow-up”, de 1966, foi às profundezas de suas fotografias e descobriu uma realidade que passou despercebida pelos seus olhos. As suas imagens revelaram o que estava oculto atrás de uma cena aparentemente banal. Tornaram o que estava invisível em visível. Trazer o invisível à tona é da natureza da fotografia. No projeto “Quintal”, essa ideia se impõe e desvenda realidades escondidas em São Paulo.


As fotografias de “Quintal” apresentam os frequentadores do Minhocão, o elevado Costa e Silva. Mostram as pessoas que usam a via expressa como espaço de diversão aos domingos. O elevado, construído para abrigar o trânsito de carros, dá, uma vez por semana, prioridade às pessoas. Aos domingos, sem veículos, o Minhocão recebe a visita de sua vizinhança. Mas diferente de outras áreas de lazer da metrópole, os 3,7 km de asfalto da avenida suspensa não têm um centímetro de espaço verde, não têm um banco sequer ou a sombra de uma árvore. Quase como miragem, seus frequentadores transformam um lugar visivelmente estéril em um espaço frutífero. Feitas nesse contexto, as fotografias de Luana nos contam quem são as pessoas que trazem à tona o invisível do Minhocão.

Olhando para a câmera e em comunhão com a fotógrafa, os personagens expõem suas relações e histórias com o elevado. Luana não é só uma testemunha dessas histórias, ela escolhe com muita precisão o que vai aparecer em suas imagens. A perspectiva da rua e os prédios como moldura dão uma noção da aridez do ambiente. A cor cinza é predominante. Mas em contraponto, os personagens e suas experiências se sobrepõem a rigidez do asfalto. Não espere de “Quintal” uma narrativa didática, mas sim uma reflexão sobre a ocupação do lugar. Nas fotografias, a relação entre o Minhocão e seus frequentadores ganha significado. Não há tensão entre a fotógrafa, os personagens e o elevado. Pelo contrário, eles dão a impressão de serem parceiros. E em silêncio parecem mirar um objetivo comum: dar à cidade um pouco de ternura que ela insiste em ocultar.

Carla Romero